Apesar de ser a título temporário, há quem tema que o espólio de Camilo Pessanha, que estava no Museu Nacional de Machado de Castro, em Coimbra, fique em definitivo na Fundação Oriente, em Lisboa, e não volte à cidade onde o poeta nasceu, há 141 anos, e à qual deixou em testamento uma grande parte dos seus pertences.
Falecido há 82 anos (a 1 de Março de 1926) em Macau, o poeta Camilo Pessanha, conhecido pela sua obra “Clepsidra”, é natural de Coimbra. No ano passado foi alvo de algumas tímidas celebrações, que pretendiam assinalar os 140 anos do seu nascimento (1867), mas o espólio do expoente do simbolismo na literatura portuguesa, que se encontrava no Museu Nacional Machado de Castro, quase nunca viu a luz do dia.
As peças de Camilo Pessanha estavam há muito tempo naquele museu, que se encontra a ser alvo de profundas e prolongadas obras, e nunca tiveram oportunidade de serem expostas. Agora, conforme confirmou o “Campeão”, estão desde Agosto em Lisboa, na Fundação Oriente, a título de depósito temporário, tendo seguido conjuntamente com a colecção Oriente do museu de Coimbra.
“Houve a Capital da Cultura e nada se fez para dar o devido relevo ao espólio do poeta”, segundo lamentou ao nosso Jornal uma personalidade que se tem dedicado ao estudo de Camilo Pessanha, sustentando, igualmente, que a Câmara Municipal tem conhecimento da situação e “não acautelou os interesses da cidade”.
A deslocação dos pertences do poeta de Coimbra para Lisboa foi também levantada, recentemente, no programa “Praça da República”, da Rádio Regional do Centro (96.2 FM), por Leite da Costa. Para o ex-director do Departamento da Cultura da Câmara Municipal, “mais uma vez Coimbra deixa sair um espólio muito valioso, que é considerado nos EUA como excepcional, e ninguém toma uma posição”, referiu, invocando recentes movimentações culturais.
O “único verdadeiro simbolista da literatura portuguesa e, em absoluto, um dos maiores intérpretes do Simbolismo europeu”, nas palavras de Barbara Spaggiari, teve como pai Francisco António de Almeida Pessanha, um estudante de Direito (mais tarde juiz), e como mãe uma criada, Maria do Espírito Santo Duarte Nunes Pereira.
Camilo Pessanha nasceu em Coimbra, no ano da morte de Baudelaire, que, dez anos antes, com a sua “teoria das correspondências”, havia lançado as bases do simbolismo francês na obra “Les Fleurs du Mal”, e em 1883 iniciou os seus estudos em Direito, onde veio a tomar contacto com as novas ideias literárias, originárias de França, com expressão nas revistas “Boémia Nova” e “Os Insubmissos”.
Opção por Macau
Datam dessa época os seus primeiros trabalhos literários, de pouca repercussão. Em 1890 António Nobre, Alberto de Oliveira, Júlio e Raul Brandão formam no Porto o grupo dos “Nefelibatas”, ao qual Eugénio de Castro (que publica nesse ano “Oaristos”, introduzindo o Simbolismo, como escola, em Portugal) e Camilo Pessanha aderem momentaneamente.
Já então Pessanha (de constituição física débil, por natureza) se ressentia dos anos de boémia vividos em Coimbra, onde o absinto era a sua bebida favorita e onde várias crises nervosas o haviam abatido. Em 1890, também, a Grã-Bretanha impõe o Ultimatum a Portugal. Em 1891 termina o seu curso. No ano seguinte é publicado em Paris o “Só” de António Nobre. Camilo Pessanha encontra-se então em Trás-os-Montes, exercendo advocacia, donde partirá, no ano seguinte, acompanhado de seu primo Alberto Osório de Castro, para Óbidos.
Decidiu-se então, devido à desilusão que a vida na província lhe havia provocado e às humilhações sofridas por Portugal no campo político, a procurar uma nova vida no Oriente, para onde concorreu a uma vaga de professor no Liceu de Macau o onde foi colocado em 1894. Aí foi, durante três anos, companheiro de Wenceslau de Moraes e exerceu as actividades de conservador do Registo Predial (1900) e juiz. Também aí ganhou o gosto pelo coleccionismo de objectos raros e pelo estudo de literatura e língua chinesa. Teve uma vida íntima atribulada, dividida entre o consumo demasiado de ópio e a relação com uma companheira chinesa que lhe deu um filho - João Manuel - nascido em 1896 e falecido alguns anos depois, devido ao ópio e à tuberculose.
Em 1920, Ana de Castro Osório edita um conjunto significativo da produção de Pessanha, sob o título de “Clepsydra”, reunindo poemas ditados de memória pelo próprio autor.
Luis Santos, Campeão das Províncias, 28 de Fevereiro de 2008
Falecido há 82 anos (a 1 de Março de 1926) em Macau, o poeta Camilo Pessanha, conhecido pela sua obra “Clepsidra”, é natural de Coimbra. No ano passado foi alvo de algumas tímidas celebrações, que pretendiam assinalar os 140 anos do seu nascimento (1867), mas o espólio do expoente do simbolismo na literatura portuguesa, que se encontrava no Museu Nacional Machado de Castro, quase nunca viu a luz do dia.
As peças de Camilo Pessanha estavam há muito tempo naquele museu, que se encontra a ser alvo de profundas e prolongadas obras, e nunca tiveram oportunidade de serem expostas. Agora, conforme confirmou o “Campeão”, estão desde Agosto em Lisboa, na Fundação Oriente, a título de depósito temporário, tendo seguido conjuntamente com a colecção Oriente do museu de Coimbra.
“Houve a Capital da Cultura e nada se fez para dar o devido relevo ao espólio do poeta”, segundo lamentou ao nosso Jornal uma personalidade que se tem dedicado ao estudo de Camilo Pessanha, sustentando, igualmente, que a Câmara Municipal tem conhecimento da situação e “não acautelou os interesses da cidade”.
A deslocação dos pertences do poeta de Coimbra para Lisboa foi também levantada, recentemente, no programa “Praça da República”, da Rádio Regional do Centro (96.2 FM), por Leite da Costa. Para o ex-director do Departamento da Cultura da Câmara Municipal, “mais uma vez Coimbra deixa sair um espólio muito valioso, que é considerado nos EUA como excepcional, e ninguém toma uma posição”, referiu, invocando recentes movimentações culturais.
O “único verdadeiro simbolista da literatura portuguesa e, em absoluto, um dos maiores intérpretes do Simbolismo europeu”, nas palavras de Barbara Spaggiari, teve como pai Francisco António de Almeida Pessanha, um estudante de Direito (mais tarde juiz), e como mãe uma criada, Maria do Espírito Santo Duarte Nunes Pereira.
Camilo Pessanha nasceu em Coimbra, no ano da morte de Baudelaire, que, dez anos antes, com a sua “teoria das correspondências”, havia lançado as bases do simbolismo francês na obra “Les Fleurs du Mal”, e em 1883 iniciou os seus estudos em Direito, onde veio a tomar contacto com as novas ideias literárias, originárias de França, com expressão nas revistas “Boémia Nova” e “Os Insubmissos”.
Opção por Macau
Datam dessa época os seus primeiros trabalhos literários, de pouca repercussão. Em 1890 António Nobre, Alberto de Oliveira, Júlio e Raul Brandão formam no Porto o grupo dos “Nefelibatas”, ao qual Eugénio de Castro (que publica nesse ano “Oaristos”, introduzindo o Simbolismo, como escola, em Portugal) e Camilo Pessanha aderem momentaneamente.
Já então Pessanha (de constituição física débil, por natureza) se ressentia dos anos de boémia vividos em Coimbra, onde o absinto era a sua bebida favorita e onde várias crises nervosas o haviam abatido. Em 1890, também, a Grã-Bretanha impõe o Ultimatum a Portugal. Em 1891 termina o seu curso. No ano seguinte é publicado em Paris o “Só” de António Nobre. Camilo Pessanha encontra-se então em Trás-os-Montes, exercendo advocacia, donde partirá, no ano seguinte, acompanhado de seu primo Alberto Osório de Castro, para Óbidos.
Decidiu-se então, devido à desilusão que a vida na província lhe havia provocado e às humilhações sofridas por Portugal no campo político, a procurar uma nova vida no Oriente, para onde concorreu a uma vaga de professor no Liceu de Macau o onde foi colocado em 1894. Aí foi, durante três anos, companheiro de Wenceslau de Moraes e exerceu as actividades de conservador do Registo Predial (1900) e juiz. Também aí ganhou o gosto pelo coleccionismo de objectos raros e pelo estudo de literatura e língua chinesa. Teve uma vida íntima atribulada, dividida entre o consumo demasiado de ópio e a relação com uma companheira chinesa que lhe deu um filho - João Manuel - nascido em 1896 e falecido alguns anos depois, devido ao ópio e à tuberculose.
Em 1920, Ana de Castro Osório edita um conjunto significativo da produção de Pessanha, sob o título de “Clepsydra”, reunindo poemas ditados de memória pelo próprio autor.
Luis Santos, Campeão das Províncias, 28 de Fevereiro de 2008
