"A cultura em Coimbra não tem expressão nacional"

6 perguntas a...
José Luís Garcia, sociólogo do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa



Considera que a cultura em Portugal é subsídio–dependente?

Não, até deveria ser mais subsidiada. Mas, ao mesmo tempo, a própria cultura podia encontrar formas autónomas, relativamente ao Estado, para se subsidiar.

Orienta uma tese de doutoramento sobre equipamentos culturais. Considera que a construção de infra–estruturas é o primeiro passo para o desenvolvimento da cultura ou há outras medidas prioritárias?
Não tenho a ideia de que as infra–estruturas sejam essenciais para defender, difundir e produzir cultura. Há outros domínios do património cultural que são fundamentais, tais como a língua, a cultura popular, a preservação e difusão de várias áreas do conhecimento. A cultura não necessita de mais salas de espectáculo embora, por vezes, estas sejam ex–libris arquitectónicos para atrair pessoas às cidades, e fomentar a cultura.

A cultura é um elemento importante para o desenvolvimento do país?
Pode haver um nível cultural muito elevado sem que tenhamos condições técnicas ou imobiliárias elevadas, e também podemos ter condições técnicas elevadas e produzir baixa cultura. A relação é extremamente complexa. O apoio a companhias de teatro e ao património musical é essencial para uma nação que não coloque o desenvolvimento dependente da economia. Geralmente processa–se o desenvolvimento como criação de riqueza económica mas o progresso é mais complexo, tem a ver com o sentimento de partilha de um espaço físico e cultural comum. Estes elementos são fundamentais numa noção de desenvolvimento complexa que não pode ser remetida para a dimensão económica. A cultura é um bem que não tem de estar ligado à noção de desenvolvimento económico.

O que acha da cultura em Coimbra?
Não tem grande expressão a nível nacional. Os media não cobrem o que acontece, do ponto de vista da cultura, fora de Lisboa e do Porto. A cidade tem uma tradição importante, a nível universitário e cultural. No entanto, há pouca expressão nacional do que se passa em Coimbra.

Coimbra é a terceira cidade a nível cultural?
Não creio que isso seja muito importante. A grande questão não tem a ver com a quantidade de iniciativas, mas sim com a sua qualidade. Estou certo que em Coimbra existem iniciativas de grande qualidade que o resto do país não conhece.

Como classificaria o estado da cultura no país?
O país tem carências do ponto de vista da leitura e das práticas culturais. O que existe é uma exposição à cultura de massas, confundida com os seus padrões mais baixos ligados à televisão e ao cinema de pouca qualidade. Por outro lado, a cultura é, muitas vezes, confundida com o mundo literário, que não é o único espaço de criação cultural. Há outras dimensões que ficam carentes, como é o caso do pensamento.


Ângela Monteiro, A Cabra, 26 de Fevereiro de 2008.